“O filho do hip-hop coreano”: Aos 24 anos, RM é um ícone do K-Pop — e uma lenda do hip-hop!

Anúncio

“O filho do hip-hop coreano”: Aos 24 anos, RM é um ícone do K-Pop — e uma lenda do hip-hop!

BTS, o grupo pop com sete integrantes da Coreia do Sul, combina as suas origens do rap com música pop energética sem esforços. O líder, Kim “RM” Nam-joon, é mais “rapper principal” do que “vocalista principal”; o nome RM é uma abreviação do seu nome artístico original, “Rap Monster”, que ele agora diz que “significa muitas coisas”; mais recentemente, ele diz que as duas letras são um acrônimo para “Real Me”, o “eu verdadeiro” em português. Desde a estreia do BTS, RM ajudou a quebrar pré-conceitos de inautenticidade não só como um idol pop da Coreia mas como um rapper da Ásia, uma identidade ainda ridicularizada no cenário atual do hip-hop.

O sucesso de RM — e o sucesso do seu grupo — é um sinal dos nossos tempos. Junto com os outros rappers do BTS, SUGA e J-Hope, ele representa as capacidades sem limite do hip-hop como o gênero mais consumido (e essencial) do mundo. Por trás do seu líder (e a inteligência sexy dele), o BTS inspirou uma das mais formidáveis fanbases na história da música ao mesmo tempo que derrubaram a organização original da música pop. Mas essa jornada, como você deve saber, nem sempre foi gloriosa.

No YouTube, há um vídeo infame de 2013 onde os integrantes RM e SUGA são desafiados por outro rapper, B-Free, que questiona o status genuíno da inspiração hip-hop do BTS enquanto um grupo pop em florescimento. A dança e a maquiagem do grupo era “como ser uma menina”, disse B-Free. Mesmo com SUGA e RM explicando seus muitos anos de dificuldades enquanto MCs desconhecidos, jovens e famintos, sem uma plataforma, o detrator rejeita a autenticidade de ambos, acrescentando: “Vocês eram pessoas no mesmo caminho que todos nós, mas não conseguiram resistir à tentação.

Namjoon começou a fazer rap em 2007, quando tinha apenas 13 anos de idade, e ganhou reconhecimento como parte do grupo underground DaeNamHyup antes de ter sucesso na sua audição para a Big Hit Entertainment, onde se tornaria o primeiro integrante do BTS ainda em 2010. O BTS eventualmente cresceu em proeminência no meio pop, mas ‘o Rap Monster’ se negou a aderir ao rótulo de “vendido” e esquecer do hip-hop. Sua primeira mixtape solo, RM, de 2015, é uma mixtape de rap sem rodeios, na mesma veia de No Ceilings, do Lil Wayne.

O maior sucesso da mixtape, “Do You”, traz Namjoon expressando seu descontentamento com livros de auto-ajuda, rótulos de gêneros musicais e, naturalmente, ideias prevalentes da autenticidade do hip-hop por cima da faixa “Aerosol Can”, de Pharrell e Major Lazer. O refrão em inglês repete a frase “do you” como um chamado por respeito ao ‘eu autêntico’ do outro. As letras dessa mixtape ou os inúmeros outros versos dos cyphers do BTS (sim, eles fazem cyphers) são lidos quase como refutações diretas a críticos como B-Free; para integrantes da cena hip-hop duvidosos em enxergar a veracidade de um idol do pop coreano como um igual, muito menos como um rapper legítimo.

O grupo não aceitou as desculpas iniciais de B-Free, então o rapper mudou de ideia. “Eu juro que o BTS tem alguns fãs ret*rdados pra c*ralho,” ele disse em um Tweet. “Quando eu ver seus oppas, vou estapeá-los por todos vocês.” O seu single de 2014, “Hot Summer”, teve cerca de 6 mil likes — e mais de 10 mil dislikes. Entre os comentários mais curtidos, está o do usuário “Namjoon’s BBG”: “Cidade de Seul? Nah, cara, só conheço Seoul do RM. STREAM MONO.

mono. é o título do trabalho solo mais recente de RM, um EP lançado em outubro do ano passado e que colecionou críticas positivas. É decididamente um esforço melódico e sem gênero especificado feito por um artista pop polivalente e que passou anos se estabelecendo como um letrista “tradicional” de hip-hop. O álbum traz ideias em carne viva sobre solidão, depressão e a busca por significados que já foram  apresentados anteriormente em faixas como “Adrift”, da mixtape RM. Apesar da sensibilidade mais pop, mono. demonstrou o jeito especial de RM para lirismo e exploração temática.

RM frequentemente usa da fonética para acrescentar significados a palavras coreanas; em “moonchild”, ele pronuncia a palavra “익숙해” (“iksukhae”) de forma semelhante a “it’s okay” (“está tudo bem”, em português), e faz uma brincadeira com os dois significados da palavra “tear” (em inglês, dependendo da pronúncia, pode significar “lágrima” ou “rasgar”). As letras e elementos temáticos presentes na música de RM se tornaram assunto de análises fervorosas, semelhante às obras de Lupe Fiasco ou Kendrick Lamar, especialmente por parte dos fãs do BTS, que construíram uma ponte com as composições musicais do rapper. RM tem feito bom uso de suas conexões, abordando temas como depressão e ansiedade, atraindo adolescentes e jovens adultos.

O intelecto de RM, com e sem o microfone, é lendário; no BTS, ele é conhecido como “o inteligente”. Tendo sido estudante modelo em seus dias acadêmicos, RM aprendeu inglês assistindo ao seriado Friends. Ele hoje em dia usa a língua, na qual ele é, certamente, o mais fluente do grupo, para ser o comunicador primário com o público internacional, incluindo um discurso emocionante dado às Nações Unidas.

Por causa do seu inglês, ele é um dos idols mais acessíveis,” Dennis, do canal kpopstups, disse em um vídeo no YouTube. “Quando o assunto é hip-hop, ele é provavelmente o melhor de todos (na minha opinião, claro). Eu sempre gosto de me referir a (“Joke”, da mixtape RM), que é, em minha opinião, o melhor rap que qualquer idol coreano já fez. Ele faz rap muito rápido ao mesmo tempo que muda o seu flow e o padrão das rimas a cada duas ou quatro barras.

Em termos técnicos, RM é um rapper muito bom,” diz o venerável T.K. Park, do blog AskAKorean. “Ele busca por suavidades e naturalidade mas, olhando mais de perto, o rap é primorosamente curado e cuidadosamente tecido.

O lirismo cuidadosamente tecido de RM é esperado considerando que seus ídolos são todos lendas do rap. Em 2014, na faixa do BTS, “Hip-Hop Lover”, ele lista os antepassados mais prestigiados do hip-hop: JAY-Z, Nas, KRS-One, Gang Starr e Black Starr, para citar alguns. O primeiro artista que ele cita, no entanto, é o Epik High, grupo de hip-hop baseado em Seul e que ajudou a moldar o gênero na Coreia ao longo dos anos 2000. Ainda que o público dos Estados Unidos possa discernir rappers coreanos como meros imitadores do estilo americano, RM é diferente; ele é filho do hip-hop coreano.

Escritores como T.K. vêm escrevendo crônicas sobre essa cultura há anos, analisando o desenvolvimento de um gênero de dança até a frequente apropriação estranho da cultura negra dos Estados Unidos. Graças a rappers como Verbal Jint, a popularidade do gênero aumentou muito ao longo dos anos, mas a questão acerca da autenticidade do hip-hop coreano ainda paira com grandeza tanto na Coreia quanto internacionalmente.

No seu artigo de 2015, intitulado “O que é real no hip-hop coreano? Uma perspectiva histórica” (“What’s Real in Korean Hip-Hop? A Historical Perspective”, no original), T.K. examina o progresso do gênero:

Para o inferno com os esnobes, eu digo. A verdadeira autenticidade não precisa de qualquer justificativa porque ela se justifica em si própria. Hoje, os principais rappers da Coreia se expressam genuinamente através de rimas e flows intrincados. Escute você mesmo e me diga se é tudo mentira. Eu te desafio.

O termo “idol” tem seu próprio significado na Coreia, uma referência aos grupos de K-Pop que são formados em empresas de entretenimento, constróem uma base enorme de seguidores e passam por um regime de treinamento rigoroso. O resultado é algo que vai de encontro à leitura dos americanos: artistas massivamente populares, como BIGBANG, com uma qualidade de produção imaculada, coreografias perfeitas e legiões de fãs. Ao mesmo tempo que o rap frequentemente é usado para complementar a música pop dançante, a sua presença tipicamente serve como um elemento estético. Dificilmente evoca o que os americanos reconhecem como “hip-hop raiz”.

Antes do BTS iniciar a carreira como um grupo de hip-hop e ter seu marketing parcialmente voltado para as suas próprias estrelas do hip-hop, havia grupos como 1TYM que montaram a sua marca de maneira similar. Mas, como apontado por Kim Bong-hyeon no livro BTS The Review: A Comprehensive Look at the Music of BTS de Kim Youngdae, há muito tempo que fãs enxergam o equilíbrio entre fazer parte de um grupo idol e ser um artista de hip-hop legítimo como impossível; que idols nunca poderiam ser “hip-hop autênticos”. “1TYM foi duramente repreendido pela qualidade da sua música,” disse Kim. “As pessoas diziam, ‘Isso não é o hip-hop autêntico que eu conheço’.

Alguns podem dizer que o BTS descobriu o segredo desse equilíbrio, mas isso levou anos. A chegada deles como um grupo idol de hip-hop — usando maquiagem e fazendo cyphers — foi vista com intensa desaprovação. “Eles foram especificamente depreciados em termos de autenticidade e legitimidade,” lembra Kim. “A maquiagem esfumada e coreografia perfeitamente ensaiada viraram alvos de condenações. As pessoas questionavam, ‘Por que homens estão usando maquiagem?’ ou ‘Por que rappers estão dançando?’… Isso me fez perceber como idols e hip-hop inerentemente entram em conflito um com o outro.

O comentário de Kim ilustra o que B-Free quis dizer quando falou para RM e SUGA que eles não conseguiram “resistir às tentações”. Os dois rappers eram artistas jovens, com dificuldades e com um mundo inteiro de talento. A decisão de se juntar a um grupo idol, usar maquiagem esfumada e dançar ao lado de vocalistas galanteadores, foi visto como “se vender” por dinheiro e fama. “Eu entendo ambos os lados,” RM reiterou ao endereçar o ceticismo. O ano era 2013, ele tinha apenas 19 anos, com uma montanha de pressão para escalar e questões para responder.

Como integrante de um grupo pop, RM foi pressionado pelos fãs a se tornar uma estrela do rap legítima, uma dualidade única que apenas sua habilidade no microfone não o ajudaria a conquistar. Mesmo depois que o BTS explodiu como um grupo de sete pessoas, raramente lançando música hip-hop propriamente dita após o sucesso inicial, RM usou do seu tempo sob os holofotes para lembrar aos seus ouvintes que ele não só conseguia fazer rap de verdade, como também via o hip-hop como sua razão de viver. Como se sabe, ele escreve seus próprios versos, mas RM também ajuda a escrever outras letras do BTS, incluindo linhas da música com inspiração neo-seoul, “Singularity”, cantada por V em seu estúdio pessoal, RKive.

RM tem um lugar importante na história do hip-hop coreano,” disse T.K. Park. “Tem havido uma tensão constante entre artistas idols e do hip-hop na Coreia, onde a comunidade hip-hop olhava com desconfiança para os idols por serem super produzidos. Mas, porque RM estabeleceu sua identidade como artistas através do hip-hop, ele foi capaz de juntar as duas comunidades e encontrar legitimidade tanto como idol quanto como rapper.

Um exemplo perfeito da síntese de RM é “Timeless”, parceria de 2018 com a lenda do hip-hop coreano Tiger JK (também conhecido como Drunken Tiger), na qual Namjoon faz uma homenagem ao rapper. “A sua vida inteira foi um show / Você gostando disso ou não, você criou outro monstro,” ele graceja em inglês, amarrando diretamente o seu nascimento enquanto artista — um idol do K-Pop e uma super-estrela — à influência de Drunken Tiger como lenda certificada do hip-hop coreano. Tiger JK dirá a você que RM desafiou as expectativas dele como idol e como artista. A barreira foi superada.

Após anos de polêmicas envolvendo a apropriação da cultura negra e hip-hop por artistas coreanos, desde a rixa entre Keith Ape e OG Maco até os inúmeros escândalos com blackface, o fato que o grupo de K-Pop que mais fez sucesso na história não somente respeita o hip-hop como trabalha para ter impacto positivo no gênero, é um feito extraordinário. Mas, novamente, se você conhece o BTS, isso faz sentido. No coração do seu espetáculo está, bom, o coração; eles têm a própria marca atrelada à autenticidade, não meramente por oferecer chavões clichês de amor próprio, mas por tentar se manter tão verdadeiros a si mesmos quanto possível.

O grupo compartilha conteúdo dos bastidores frequentemente, incluindo um reality show onde foram até os Estados Unidos e cresceram como artistas do hip-hop enfrentando diversos obstáculos. Eles dividem suas vidas e reflexões através de gravações e entrevistas em seus Comeback Shows. Suas músicas frequentemente lidam com temas relacionados à saúde mental; sua última trilogia é intitulada Love Yourself. Seus maiores sucessos comumente fazem reflexões potentes, concisas e muito honestas acerca do amor próprio; isso inclui “IDOL”, o single que recebeu um remix com a participação de Nicki Minaj. A música, um dos seus maiores sucessos com o grande público até agora, começa com as reflexões incisivas de RM sobre a percepção das pessoas acerca do seu grupo e dele próprio:

Você pode me chamar de artista / Pode me chamar de idol / Eu não ligo para o que você me chama, eu não me importo.

Fonte: Elliot Sang @ DJBooth

Artigos | por em 04/08/2019
Compartilhe:

Comentários:


This error message is only visible to WordPress admins

Error: No connected account.

Please go to the Instagram Feed settings page to connect an account.

Anúncio