Como abraçar a cultura coreana ajudou o BTS a alcançar o sucesso 🇰🇷

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Como abraçar a cultura coreana ajudou o BTS a alcançar o sucesso 🇰🇷

Apesar do K-pop vir sendo um fenômeno internacional por duas décadas, debates sobre a definição precisa do termo “K-pop” ainda estão com tudo. É difícil de resolver porque não é sempre que está claro o que é tão coreano sobre o K-pop. K-pop é K-pop porque é música apresentada (em sua maioria) por artistas coreanos, mas e além disso? Com “IDOL”, a faixa-título do álbum LOVE YOURSELF: 結 ‘Answer’, o BTS meio que dá uma resposta. Mesmo que seja exagero chamar “IDOL” de música tradicional coreana, a faixa faz amplo uso do chuimsae [추임새], uma técnica que usa de exclamações extras entre as letras para atrair a atenção da plateia (à exemplo de “얼쑤 좋다” e “지화자 좋다” no refrão de “IDOL”). Ademais, o MV de “IDOL” traz construções tradicionais da Coreia, onde os rapazes dançam em trajes de seda tipicamente coreanos.

O uso que o BTS faz de elementos tradicionais coreanos, tanto em suas músicas quanto em suas apresentações visuais, é, na verdade, uma qualidade rara. Desde que o K-pop começou sua expansão no começo dos anos 2000, ele vem tentando se misturar no mercado local. Para esse fim, a primeira geração dos artistas internacionais de K-pop não fizeram qualquer esforço particular para apelar a sua “coreanisse” para expandir seu alcance. No mercado internacional, esses artistas lançavam músicas em inglês, chinês ou japonês, falavam na língua local em entrevistas e buscavam suas músicas com os principais compositores da Suécia. Essa foi uma mudança clara dos métodos usados por Seo Taiji and Boys [서태지와 아이들] — grupo largamente conhecido como o manancial do K-pop moderno, que fez questão de incorporar aspectos da cultura coreana em suas músicas. “Hayeoga [하여가]”, o título da canção do segundo álbum do grupo, de 1993, é uma mistura de rap jamaicano, heavy metal e música tradicional da Coreia. A faixa-título do álbum seguinte, “Dreaming of Balhae [발해를 꿈꾸며]”, é uma música que clama pela unificação na Península Coreana, com um MV gravado na antiga sede do Partido Comunista, próxima da zona desmilitarizada.

O esforço para infusionar as tradições culturais e musicais coreanas na música pop ocidental vem desde a origem da música pop na Coreia. Em 1974, Shin Jung-hyeon [신중현], o “Padrinho do Rock”, compôs a icônica “Beauty [미인]” na escala pentatônica coreana. O famoso guitarrista Kim Su-cheol [김수철] foi o primeiro artista a buscar a fusão entre pop ocidental e coreano de forma consistente e sistemática, a ponto de se tornar popular o suficiente fora da Coreia para apresentar sua música nas Olimpíadas de Seul de 1988 e na Copa do Mundo FIFA de 2002, no Japão e na Coreia do Sul. A tendência continua até os dias de hoje, com bandas indies coreanas como a Second Moon e Jambinai, cujas versões exuberantes e modernizadas de músicas tradicionais da Coreia foram apresentadas na cerimônia de encerramento das Olímpiadas de Pyeongchang em 2018.

Entretanto, os grupos idol e artistas de hip-hop da Coreia têm sido relutantes em incorporar sua herança coreana em suas músicas, os primeiros devido às preocupações com a viabilidade comercial no mercado internacional, os últimos por causa da preocupação em apresentar um hip-hop “autêntico”, que é talhado mais próximo daquilo que o público americano reconhece. Ainda assim, eles fizeram tentativas esporádicas de introduzir a cultura tradicional em suas músicas. Em “Shangri-La [도원경]”, o grupo idol VIXX fez uso do instrumento gayageum [가야금] no instrumental da canção e incluiu acessórios e roupas coreanas no MV. O rapper Nuck [넋업샨] também explorou um casamento entre cultura coreana e hip-hop. Sua música, “Bulhandangga [불한당가]”, foi uma brilhante versão moderna de jeokbyeokga [적벽가], um dos números clássicos do pansori [판소리], que é uma forma de canto narrativo.

Contudo, essas tentativas (exceto, talvez, a do VIXX) não foram largamente ouvidas foram do mercado doméstico da Coreia. A incorporação da cultura coreana feita pelo BTS vem em um contexto diferente: eles já são um grupo internacional imensamente popular enfrentando um público global. “IDOL” veio depois do BTS já ter chegado ao primeiro lugar da Billboard 200. Num ponto onde a maior parte dos artistas de K-pop internacionais tentariam se misturar ainda mais no mercado local — como BoA fez após chegar ao topo da Oricon Singles do Japão em 2003 —, o BTS escolheu dobrar a intensidade da sua “coreanisse”. O grupo pareceu se dar conta que não poderiam ser como os idols pré-existentes, nem poderiam ser como boy bands americanas.

Anterior ao sucesso imenso do BTS nos Estados Unidos, parecia que a localização estratégica do K-pop encontrava um impedimento no mercado estadunidense. Muito depois do K-pop já ter se tornado uma sensação internacional no restante do mundo, as estações de rádios dos Estados Unidos resistiam em tocar K-pop apesar das tentativas de agradar especificamente ao mercado americano. O BTS foi capaz de ir além da onde seus conterrâneos foram ao tomar um caminho diferente: apresentando uma representação autêntica de si mesmos, que cresceram com seus fãs. Entretanto, eles continuam enfrentando nos Estados Unidos algumas barreiras estruturais que os impedem de receber o reconhecimento oficial que merecem. O BTS não recebeu uma indicação sequer ao Grammy no final de 2017. Jeff Benjamin, colunista de K-pop para a Billboard, sugeriu que o grupo poderia buscar por um Grammy na categoria “World Music” — uma ideia empreendedora, mas não totalmente apropriada à boy band mais popular dos Estados Unidos. Nesse ambiente desfavorável, a guinada do BTS aos elementos  coreanos pode ser o caminho certo para superar as limitações da estratégia de localização (na verdade, até as partes que não são em coreano em “IDOL” não são, em nenhum momento, ocidentais uma vez que o grupo se apoiou muito nas batidas gqom, originárias da África do Sul). É, também, uma demonstração de confiança na sua identidade coreana, independentemente do que os comitês de premiações podem pensar.

Comparando os MVs de “Hayego”, de Seo Taiji, e de “IDOL” dá um vislumbre sobre a evolução do relacionamento entre o K-pop e a cultura pop americana nos últimos 25 anos. O MV de “Hayeoga” começa em uma balada de Itaewon, um distrito multicultural de Seul, com um grupo de afro-americanos mostrando seus movimentos de dança para os locais. Um coreano, se sentindo ameaçado pelos dançarinos, pede ajuda ao Seo Taiji and Boys; o grupo exibe seus próprios movimentos, ganhando o respeito dos dançarinos. Em contraste, o MV de “IDOL” traz a participação de Nicki Minaj. Mas o BTS não procura a aprovação de Nicki, nem ela está lá para ensinar algo ao BTS. Eles estão, no entanto, participando de uma troca, com Minaj tomando emprestado elementos estéticos coreanos em seu segmento ao apresentar seus versos em hangul ao fundo. Ainda que Seo Taiji tenha, corajosamente, misturado a música coreana com o pop ocidental, ele reconheceu, em 1993, que a indústria musical dos Estados Unidos era o guardião final do sucesso global. Em 2018, o BTS é a maior boy band e esse já não é mais o caso.

Fonte: Vulture

Artigos | por em 28/09/2018
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